sexta-feira, 27 de abril de 2007

Morte: encontro definitivo com Deus

No princípio do cristianismo havia uma forte confiança na realidade da salvação no contexto integral da vida humana. Porém, a perseguição aos cristãos fez surgir uma linguagem apocalíptica sobre a morte e a eternidade. Começaram a surgir imagens fortes para expressar a convicção da salvação em Jesus Cristo. Contudo, quando as perseguições terminaram as imagens permaneceram e muitos cristãos continuaram a se sentir como eternos perseguidos, não percebendo mais com nitidez que o amor de Deus é sem limites. Deus, o criador, aceita os limites de suas criaturas, tentando, continuamente, que os limites sejam superados pelo amor. Portanto, quando morremos não somos levados a um tribunal divino.

Infelizmente, ao longo do tempo, o que predominou na relação com Deus foi uma imagem de culpa extremada e um medo assustador. É certo que a crença no amor de Deus que perdura para sempre me leva ao confronto com a minha vida, mas não para transformá-la numa vida de medo e culpa e sim numa vida de libertação. Somos seres limitados é verdade, mas a nossa limitação pode ser vencida pelo amor.

No princípio do cristianismo, a crença na vida eterna era uma razão para se viver melhor desde já, e não apenas um sentimento de espera. A convicção era tão grande que muitos se dirigiam "Sorrindo para a boca do leão", enfrentavam o martírio com muita serenidade. Não há mais lugar para o medo, e em vez de cada um cuidar, de maneira até egoísta, de salvar a sua própria alma, sobrará energia para se preocupar com o mundo e com que é a própria tarefa do cristão. A primeira tarefa do cristão não é cuidar de sua própria salvação. A primeira tarefa do cristão é trabalhar para que o Reino de Deus se realize. Libertado do medo e das preocupações augustiadas com a salvação de sua alma, a fé pode tornar-se prática de vida transformadora.

Hoje ainda vivemos uma religiosidade cristã que se transmite de maneira muito opressiva. Muitos crêem por medo da morte e do inferno, trazendo consequências negativas para a prática do cristianismo no mundo, pois, se temos uma imagem de Deus como carrasco, seremos carrascos para os nossos semelhantes. Uma imagem opressiva de Deus leva os crentes a oprimir seus semelhantes.

O inferno não pode ser pregado como uma arma para assustar pessoas ou ateus, como foi durante muito tempo. É preciso superar a força opressiva do inferno neste mundo para poder lutar contra os infernos que começam aqui. É preciso construir uma fé com esperança. Uma esperança que é um movimento dinâmico, de transformação, que não se conforma em trabalhar pensando apenas num outro mundo, mas que atua desde já, na esperança de realizar o encontro definitivo com Deus na eternidade.

Superado o medo e o complexo de culpa presente, muitas vezes, em nossa experiência de morte, podemos vislumbrar um pouco daquilo que a fé cristã coloca sobre este momento. É na morte que, de fato, poderemos encontrar Deus face a face(1Cor 13,12). E, sendo assim, a morte não é um momento estático. Quando chegamos a essa situação final de nossa vida terrestre podemos afirmar que chegamos ao estado de morte. Um estado transitório que nos levará a uma realidade final. Ao morrer, não há mais possibilidade de ficarmos indiferentes frente ao convite do Deus da vida. Portanto, se não passamos pela morte não poderemos nos encontrar, definitivamente, com Deus.

Na morte é o próprio ser humano quem se julga e não Deus. o ser humano, quando morre, não comparece frente a um juiz, e sim frente ao amor infinito de Deus. É na morte que, finalmente,o ser humano pode experimentar Deus como fim último de sua existência. Apesar de nossa limitação, de nosso pecado, o encontro com Deus é encontro de amor. É um encontro no qual a pessoa humana reconhece o que, na realidade, Deus pretendia com a totalidade de sua vida. Então, pode-se experimentar quão pouco se realiza daquele projeto humano que Deus tem para todos. É aqui que a existência humana encontrará, ou não, verdadeiramente,a razão última de sua existência.

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